Inspiração da Bíblia
Apesar de haver um consenso geral sobre a inspiração da Bíblia, há uma variedade de conceitos a respeito do que ela vem a ser. Alguns se concentram na ação dos autores, outros nos escritos e outros nos leitores. Alguns relacionam a inspiração à mensagem central da Bíblia, outros aos pensamentos e outros às palavras.
Essas diferenças, frutos dos infindos ataques que a Bíblia recebeu nos últimos dois séculos, tornam necessário o estudo acerca da “inspiração da Bíblia”.
• O RELATO BÍBLICO A RESPEITO DA INSPIRAÇÃO
A doutrina da inspiração não é invenção de teólogos. A própria Bíblia a expõe enfaticamente. Ela dá testemunho de si mesma (o que não é considerado válido pelos seus inimigos) e tem testemunho da história.
Observemos alguns textos bíblicos:
1) 2Timóteo 3.16
Esse texto mostra a extensão da inspiração (toda a Escritura). No contexto bíblico, Escritura significa tanto o AT como o NT (Lc 24.45; Jo 10.35; Lc 4.21; 1Tm 5.18 cf. Dt 25.4 e Lc 10.7; 2Pe 3.16).
Fica claro que a inspiração vem da parte de Deus. As Escrituras foram “sopradas por Deus” (significado de inspiração).
O propósito da inspiração é tornar as Escrituras “úteis”. Assim, a Bíblia veio de Deus para nos mostrar como viver e o que devemos fazer.
2) 2Pedro 1.21
Esse texto mostra que Deus usou autores humanos, movendo-os para esse fim pelo Espírito Santo. O mesmo verbo “mover” é também usado em At 27.15 e nos ajuda a entender seu sentido. Durante a tempestade, os marinheiros não estavam dormindo nem inativos, mas era o vento quem, de fato, os levava.
Outro fator importante revelado nesse texto é que não foi a vontade humana quem produziu as Escrituras. A vontade humana pode falhar e pode produzir erros. Porém, não é assim com a vontade de Deus. Isso atesta a inerrância bíblica.
Resumindo, 2Pe 1.21 diz que Deus usou homens e deixou para nós uma Bíblia totalmente confiável.
3) 1Coríntios 2.13
Aqui fica claro que a revelação de Deus chegou até nós por meio de palavras. Assim, Deus não só inspirou as ideias reveladas pela Bíblia, mas as palavras que a compõe.
Ou seja, as palavras usadas na Bíblia foram inspiradas por Deus.
4) Uma Compilação de Dados
Vejamos a variedade de material que Deus fez os autores incluírem na Bíblia:
a) Diretamente de Deus: (Dt 9.10).
b) Pesquisado: (Lc 1.1-4).
c) Profético: aproximadamente, 25% da Bíblia consiste em profecias, boa parte já cumprida com exatidão. Nenhum homem poderia acertar 100% das profecias se fizesse por si mesmo.
d) Histórico: boa parte da Bíblia é histórica, a maior parte escrita por homens que viveram o que foi relatado.
e) Outros: a Bíblia registra algumas coisas que não são verdadeiras – como as mentiras de Satanás (Gn 3.4-5) –, mas o faz de maneira precisa, como realmente aconteceram. Também contém citações de escritos de pessoas incrédulas (Tt 1.12), além de trechos que revelam experiências pessoais e emoções (Rm 9.1-3). Contudo, essa variedade de material é registrada com precisão.
• DEFINIÇÃO DE INSPIRAÇÃO
Uma definição abrangente de inspiração seria: Deus supervisionou os autores humanos da Bíblia para que compusessem e registrassem, sem erros, sua mensagem à humanidade utilizando as palavras de seus escritos originais.
Isso significa que Deus não ditou as palavras da Bíblia (algumas vezes até o fez) para os escritores, mas os supervisionou soberanamente para que, no uso de suas capacidades mentais e habilidades, compusessem um material que fosse verdadeiro (Jo 17.17) e que fosse o que Deus desejava nos revelar.
• DESVIOS DA DOUTRINA DA INSPIRAÇÃO
a) Inspiração natural — Crê que os autores escreveram sem a supervisão de Deus.
1) Deus não inspirou as palavras;
2) A Bíblia está no mesmo patamar de outros escritos; e
3) Exclui a inerrância e a infalibilidade.
b) Inspiração mística — Crê que a Bíblia foi escrita por homens cheios do Espírito Santo. De igual modo outros escritos, como os dos pais da igreja e de grandes homens durante a história. Nesse caso:
1) Outros escritos seriam tão inspirados quanto a Bíblia;
2) Os livros da Bíblia não são infalíveis; e
3) A Bíblia representa uma importante literatura religiosa que pode, inclusive, conter mensagens de Deus.
c) Níveis de inspiração — Crê que algumas partes da Bíblia são mais inspiradas que outras. Toda a Bíblia seria inspirada por Deus, porém, com diferença no grau de inspiração entre as partes.
d) Inspiração parcial — Crê que algumas partes da Bíblia foram inspiradas por Deus e outras não. Nesse ponto de vista, o que é inspirado é o propósito da Bíblia. Assim, quando fala da salvação, ela é confiável, mesmo que tenha erros históricos ou científicos.
e) Inspiração conceitual — Crê que os conceitos bíblicos são inspirados e não as palavras. Assim, a mesma ideia exposta de outro modo é tão inspirada quanto a original.
f) Inspiração neo-ortodoxa — Nesse caso, a revelação está centrada em Jesus Cristo. A Bíblia, mesmo possuindo erros, é válida ao nos apresentar Jesus. Assim, a Bíblia é produto humano falível, mas pode se tornar a Palavra de Deus quando lida por nós. Ou seja, a Bíblia se torna Palavra de Deus quando Cristo fala conosco em suas páginas. Desse modo, a Bíblia não possuiria autoridade, mas seria um bom instrumento nas mãos de Cristo, apesar de possuir erros.
A Inerrância da Bíblia
Inerrância significa que a Bíblia não tem erros. Esse conceito é constantemente atacado e o combate a ele ou não tem estabelecido uma linha divisória entre os evangélicos.
• A IMPORTÂNCIA DA INERRÂNCIA
1) Inerrância declarada
Não é possível crer na Bíblia sem crer na inerrância total. Crer que ela pode ter erros é torná-la totalmente indigna de confiança, já que não é possível estabelecer até aonde os erros chegariam. Matérias como Cristologia e Soteriologia perderiam a credibilidade por falta de certeza de que a Bíblia as expõe corretamente. Não importa que tamanho sejam os “erros” da Bíblia. O menor deles faz com que as doutrinas bíblicas entrem em colapso. Algumas consequências disso seriam:
a) Visão liberal da seriedade do adultério;
b) Visão liberal da seriedade do homossexualismo;
c) Visão liberal do divórcio e do novo casamento;
d) Reinterpretação “cultural” de alguns ensinos da Bíblia (ex.: submissão da mulher, obediência civil e sexo antes do casamento);
e) Tendência a encarar a Bíblia pela óptica da psicologia moderna.
2) Inerrância diluída
Para muitos, brigar pela inerrância da Bíblia é fazer uma tempestade em um copo de água. Esses dizem que a Bíblia não fala claramente sobre sua inerrância. Contudo, para fazerem tal afirmação, eles teriam de mostrar que ela também não ensina isso de modo claro.
O fato de a Bíblia não falar sobre a inerrância usando esse termo, não quer dizer que essa verdade não seja exposta pela Bíblia. È como a doutrina da Trindade, a qual não é apoiada por um texto sequer que contenha a palavra “Trindade” e, nem por isso, é menos verdadeira e bíblica. Do mesmo modo, Jesus nunca disse: “eu sou Deus”, contudo a evidência bíblica atesta sua divindade.
Esse tipo de exigência de só se crer se houver um versículo que, com todas as letras, exponha e encerre a questão, não é o meio correto de interpretação das Escrituras. Usando esse critério, seria válido dizer que o time vencedor de um torneio não é campeão porque perdeu uma partida no decorrer do campeonato para a equipe que ficou em último lugar.
Outro ataque contra a inerrância é dizer que ela é uma doutrina nova e que a igreja nunca se preocupou com isso no passado. A inerrância, na verdade, foi defendida por pessoas como Jesus (Jo 10.35) e Paulo (2Tm 3.16). Sem falar de homens de Deus que a defenderam de modo veemente:
a) Agostinho (354-430) afirmou: “As consequências mais desastrosas devem seguir-se à crença de que existe algo falso no livro sagrado. Isso equivale a dizer que os homens por meio dos quais as Escrituras chegaram até nós, encarregados de colocá-las por escrito, registraram algo falso nesses livros. Se nesse sagrado santuário de autoridade se admitir a possibilidade de haver uma só declaração falsa, não restará uma única sentença desses livros que, parecendo a alguém difícil de praticar ou de nela crer, não possa ser explicada pela mesma regra fatal como uma afirmação na qual o autor, intencionalmente, declarou o que não era verdade” (Epístola).
b) Tomás de Aquino (1224-1274): “Nenhuma falsidade pode fundamentar o sentido literal das Escrituras” (Suma Teológica).
c) Lutero: “As Escrituras jamais erraram”.
d) John Wesley: “Se existe qualquer erro na Bíblia, bem poderiam existir mil deles. Se existe uma só falsidade naquele Livro, não proveio do Deus da verdade”.
• O SIGNIFICADO DA INERRÂNCIA
A inerrância significa que tudo que a Bíblia ensina e apresenta é verdadeiro, podendo incluir aproximações, citações livres, linguagem figurada e narrativas diferentes do mesmo evento desde que não se contradigam.
É claro que essa forma complexa de se transmitir a verdade cria diversas “aparentes” dificuldades, sem contudo, apresentar erros. Alguns exemplos são:
a) 1Co 10.8 diz que 23 mil morreram em um só dia e Nm 25.9 afirma que foram 24 mil, sem incluir a restrição “em um só dia”;
b) Linguagem figurada como “nascer” e “pôr do Sol”. Apesar de não condizer com o que a ciência já descobriu, sãos expressões corretas da observação humana e linguagem corriqueira ainda hoje;
c) Mc 10.46-52 e Lc 18.35-43 contam que Jesus curou um cego em Jericó, enquanto Mt 20.29-34 diz que eram dois cegos. Na verdade havia dois cegos, mas Marcos e Lucas contaram a história de um deles, Bartimeu.
O entendimento do tipo de linguagem usado e o propósito do autor devem ser levados em conta. Caso contrário, teremos dificuldades de conciliar textos como o de Mt 4.4, que diz que o homem deve viver das palavras que procedem da boca de Deus, em comparação com 2Tm 3.16, que diz que toda a Escritura é inspirada por Deus.
• A INERRÂNCIA NOS ENSINOS DE CRISTO
1) As evidências de ‘Mt 4.1-11’
a) Jesus disse, referindo-se às Escrituras, que o homem deveria viver de “toda palavra” que sai da boca de Deus (v.4 cf. Dt 8.3);
b) Quando Satanás citou o Sl 91.11-12, ele omitiu uma parte do v.11 que muda completamente o sentido do texto, mostrando que a ideia não era a de que Deus protege de riscos desnecessários e descabidos. Jesus respondeu que fazer uso do texto desse modo era tentar a Deus, já que o homem deve viver de “toda palavra” que procede de Deus; e
c) A resposta de Jesus a Satanás foi: “Está escrito” (vv.4,7,10).
2) As evidências do ‘Antigo Testamento’ usadas por Cristo
a) Jesus reconheceu que Adão e Eva eram pessoas reais, criadas por Deus, e agiram de maneiras específicas (Mt 19.3-5; Mc 10.6-8);
b) Creu serem verdadeiros os eventos envolvendo os dias de Noé (Mt 24.38-39; e Lc 17.26-27);
c) Confirmou a destruição das cidades de Sodoma e Gomorra e a historicidade de Ló e da sua esposa (Mt 10.15; Lc 17.28-29); e
d) Aceitou como verdadeira a história de Jonas e o peixe (Mt 12.40) e a historicidade de Isaías (Mt 12.17), Elias (Mt 17.11-12), Daniel (Mt 24.15), Abel (Mt 23.35), Zacarias (Mt 23.35), Abiatar (Mc 2.26), Davi (Mt 22.45), Moisés e seus escritos (Mt 8.4; Jo 5.46), Abraão, Isaque e Jacó (Mt 8.11; Jo 8.39).
3) A evidência de ‘Mt 5.17-18’
O termo “a Lei e os profetas” envolvia todo o Antigo Testamento. Jesus disse que ele jamais passaria, sem que se cumprisse nem mesmo um “i” ou um “til” (ARA) ou a “menor letra” ou “traço” (NVI). Ao dizer isso, Jesus se referiu ao yod, a menor letra do alfabeto hebraico. Também se referiu ao que é chamado de “til” ou “traço”, que é um pequeno sinal gráfico que diferencia letras hebraicas muito parecidas como o beit e o kaf ou o dalet e o resh. Isso demonstra a confiança que Jesus tinha em cada palavra das Escrituras.
4) A evidência de ‘Jo 10.31-38’
Depois de afirmar sua divindade (Jo 10.30), os judeus se enfureceram e quiseram apedrejá-lo. Jesus os dissuadiu dessa ideia citando o Salmo 82, ao qual chamou de Lei. Disse que se aos homens foi atribuído o termo “deuses”, devido à alta posição a eles concedida, era correto que ele usasse o mesmo termo para si devido à unidade que tinha com o Pai. O interessante é que essa argumentação não se apoiou em livros ou capítulos da Bíblia, mas em uma palavra: Elohim, que significa “Deus”.
Isso mostra, mais uma vez, que Jesus cria na inspiração de cada palavra, mesmo as que estão presentes em um salmo que não é nem famoso, nem fundamental no Antigo Testamento. Jesus, ao citá-lo, ainda afirmou que “a Escritura não pode falhar” (v.35).
5) A evidência de ‘Mt 22.23-33’
Jesus expôs o erro dos saduceus de crer no Pentateuco, mas não nos anjos e na ressurreição. Acusou-os de errarem por não conhecerem nem as Escrituras, nem o poder de Deus (v.29). Jesus disse que a pergunta que fizeram era irrelevante, pois no céu seremos como “anjos”, os quais não se casam (v.30). Também citou o texto de Ex 3.6 para provar que há vida após a morte, mostrando que foi dito a Moisés que Deus era Deus de Abraão, Isaque e Jacó mesmo que eles tivessem morrido muitos anos antes.
6) A evidência de ‘Mt 22.41-46’
Em primeiro lugar, Jesus disse que Davi falou “pelo Espírito” (v.43), demonstrando sua convicção na inspiração das mínimas palavras. Foi apoiado em uma mínima palavra que ele provou que o Messias não era apenas “filho de Davi”, mas também o “Deus de Davi”. Ele se apoiou na palavra “meu” (“disse o SENHOR ao meu Senhor”). A divindade de Jesus foi apoiada nessa pequena palavra, pois Jesus tinha convicção de que cada uma delas vinha de Deus.
• PASSAGENS PROBLEMÁTICAS
A Bíblia tem algumas dificuldades. Elas, na verdade, não constituem erros, mas “aparentes” discrepâncias que são solucionadas quando analisadas com cuidado. Também lembramos que cremos na inspiração da mesma forma que cremos na divindade: pela fé. Mesmo quando os homens tentam provar que Deus não existe, nossa fé fica inabalada. Do mesmo modo, diante de dificuldades na Bíblia nossa fé mantém nosso conceito sobre a inerrância, pois cremos que as Escrituras nos foram dadas por Deus (2Tm 3.16; 2Pe 1.21).
1) As ‘duas narrativas’ da criação
Enquanto Gn 1.11-12 diz que as plantas foram criadas no terceiro dia, Gn 2.5 dá a entender que não havia plantas antes da criação do homem, o que só ocorreu no sexto dia. Na verdade, Gn 2.5 não fala de todo tipo de planta, mas das que precisam ser “lavradas” ou “cultivadas” pelo homem, de modo que Gn 2.5 é um complemento do que foi dito em Gn 1.11-12. Do mesmo modo, foi dito em Gn 1.27 que Deus criou “homem e mulher”, cujos eventos depois foram detalhados no relato de Gn 2.18-23.
2) A esposa de Caim
A pergunta é: se só existia a família de Adão, onde Caim encontrou sua esposa? A resposta está no texto de Gn 5.4 que diz que Adão gerou filhos e filhas. A esposa de Caim, assim como a de Sete, foi uma das suas irmãs. Tal casamento não gerou nenhum tipo de anomalia (como é arriscado acontecer hoje) porque os genes defeituosos que produzem esses tipos de mal não estavam presentes na criação de Deus.
Antes de ficarmos chocados com isso, devemos lembrar que esse tipo de casamento voltou a acontecer depois do dilúvio entre os netos de Noé, quando o casamento de parentesco mais distante possível era entre primos. O próprio Abraão se casou com sua “meio-irmã” (Gn 20.12). Só mais adiante Deus proibiu esse tipo de relação (Lv 18.6).
3) ‘Nm 25.9’
Moisés disse que a praga que seguiu a adoração de Israel a Baal-Peor matou 24 mil pessoas, enquanto Paulo diz que foram 23 mil (1Co 10.8). A diferença dos dois relatos está no fato de Paulo dizer que 23 mil morreram “em um só dia”. As outras mortes provavelmente ocorreram depois. Outra possibilidade que não afeta a inerrância seria o arredondamento por parte dos dois autores, assim como nós fazemos ao nos referirmos a uma viagem de 1.500 quilômetros, quando, na verdade, a distância correta era de 1.523 quilômetros.
4) Quem fez Davi contar os israelitas? (‘2Sm 24.1’; ‘1Cr 21.1’)
Um texto diz que foi Deus e outro diz que foi Satanás. Na verdade, Deus, soberanamente, usou Satanás para cumprir seu plano do mesmo modo que o fez para manter a humildade de Paulo por intermédio do “espinho na carne”, o qual Paulo chamou de “mensageiro de Satanás” (2Co 12.7).
5) Quem matou Golias? (‘2Sm 21.19’; ‘1Sm 17.50’)
Quem matou Golias foi Davi ou Elanã? Nesse caso, o problema é de cópia. Comparando com 1Cr 20.5, percebemos que o copista errou ao copiar 2Sm 21.19, cuja provável mensagem seria: “E Elanã, filho de Jair (ou Jaaré-tecelão), feliu a Lami, irmão de Golias”.
6) Certos números apresentados em ‘2Sm 24’ e ‘1Cr 21’
a) O texto de 2Sm 24.9 registra 800 mil em Israel e 500 mil em Judá, enquanto 1Cr 21.5 apresenta 1,1 milhão em Israel e 470 mil em Judá. No registro de 2Sm 24, o número não inclui o exército permanente de 288 mil (1Cr 27.1-15), nem os 12 mil especificamente destacados para Jerusalém (2Cr 1.14), que, somados aos 800 mil, dá exatos 1,1 milhão. Já os 470 mil de 1Cr 21 não incluem os 30 mil do exército permanente de Judá (2Sm 6.1);
b) O de castigo pela contagem é de 7 anos em 2Sm 24.13 e de 3 anos em 1Cr 21.12. Esse é mais um erro de cópia. Isso se deve à semelhança entre as letras hebraicas usadas para grafar os números 3 e 7. O correto é que eram 3 anos e, por causa disso, a versão NVI traduz 1Cr 21 desse modo.
7) As medidas de ‘2Cr 4.2’
As medidas do mar de fundição não batem, pois diz que o diâmetro dele era de 450 cm. Porém, quando diz que a circunferência era de 13,5 m, percebemos que essa não é a circunferência de um círculo cujo diâmetro mede 450 cm, mas sim, 430 cm. Há uma discrepância de 20 cm. Entretanto, o v. 5 desfaz essa impressão ao dizer que a espessura da borda era de 10 cm. Ou seja, o mar de bronze de circunferência interna de 13,5 m, cujo diâmetro era de 430 cm, tinha de diâmetro “total”, incluindo 20 cm da espessura das duas bordas externas, exatos 450 cm.
8) Levar o bordão (‘Mc 6.8; Lc 9.3’)
Jesus permitiu ou não levar o cajado? Na verdade, Jesus permitiu que os discípulos levassem um cajado que possuíssem. Contudo, caso não tivessem, não deveriam levar um na viagem. Chegamos a essa conclusão ao observar Mt 10.9-10, que diz que tais coisas não deveriam ser “adquiridas” para a viagem, não que não pudessem ser usadas. É o caso de não poder levar duas sandálias, podendo, contudo, levar uma: a que ia no pé. A intenção de Jesus era que os discípulos “não fizessem provisão especial para essa missão”.
9) A semente de mostarda (‘Mt 13.32’)
Jesus disse que a semente de mostarda era a menor das sementes. Porém, sabe-se que há sementes menores. Mas, quando Jesus falou isso, disse que era a semente “que um homem plantou no seu campo”. Fica claro que Jesus apelou para a experiência dos judeus, que, das espécies cultivadas, tinha a mostarda como o exemplar de menor semente.
10) Os cegos de Jericó (‘Mt 20.29-34’; ‘Mc 10.46-52’; ‘Lc 18.35-43’)
Eram um ou dois cegos? Como já vimos, eram dois e Mateus está certo em sua afirmação. Porém, Lucas e Marcos se concentraram em um só deles. O motivo disso é que, provavelmente, ele era muito conhecido e isso justifica eles terem citado seu nome: Barjesus.
11) O pai de Zacarias (‘Mt 23.35’)
Zacarias era filho de Beraquias (Zc 1.1) ou de Joiada (2Cr 24.20)? Na verdade, esses dois Zacarias são pessoas diferentes. O Zacarias de 2Cr 24.20-21 viveu antes do cativeiro babilônico e foi apedrejado. O outro Zacarias é o profeta autor do livro que leva seu nome. Ele viveu no período posterior ao exílio e era filho de um homem chamado Beraquias. Apesar de as Escrituras não falarem que ele foi martirizado, esse é a quem, provavelmente, Jesus se referiu, citando corretamente o nome do seu pai e usando um profeta dos tempos do encerramento do AT, traçando uma linha do início ao fim da história registrada no AT ao dizer “de Abel a Zacarias”.
12) Zacarias ‘versus’ Jeremias (‘Mt 27.9-10’)
Mateus cita Jeremias a respeito de um texto que encontramos em Zc 11.12-13. Esse pode, tanto ser um erro de cópia, como um modo de os judeus pós-exílio se referirem às Escrituras. Jeremias é o primeiro livro do Talmude Babilônico e o profeta era proeminente na mente dos judeus dos tempos de Jesus (Mt 16.14). Assim, Mateus pode ter se referido às Escrituras citando Jeremias, além de ter em mente os eventos relacionados à casa do oleiro registrados em Jr 18 e 19.
13) Isaías ‘versus’ Malaquias (‘Mc 1.2-3’)
Marcos cita um texto de Malaquias dizendo ser de Isaías. Provavelmente, Marcos usa Isaías com a intenção de associá-lo não àquele texto em particular, mas ao assunto como um todo que era a pessoa de Cristo, a quem ele acabara de mencionar. Nesse caso, o profeta Isaías é notável, pois fala muito do Messias, principalmente em Is 53, texto esse conhecido como “o servo sofredor”. Devemos lembrar que a óptica sob a qual Marcos apresenta Jesus em seu Evangelho é a de Jesus como “servo”.
14) Abiatar ‘versus’ Aimeleque (‘Mc 2.26’)
Marcos diz que Davi comeu os pães da proposição nos dias de Abiatar, mas 1Sm 21.1-6 diz que o sumo sacerdote era Aimeleque, pai de Abiatar (1Sm 22.20). Contudo, Jesus não se referiu a Abiatar como sendo o sumo sacerdote, mas disse “nos dias de Abiatar”. Na sequência do relato histórico, Saul mandou matar Aimeleque e os seus, mas Abiatar conseguiu sobreviver, tornando-se sumo sacerdote durante todo o reinado de Davi, sendo deposto apenas no início do reinado de Salomão (1Rs 2.27). Assim, o fato histórico em questão realmente aconteceu “nos dias de Abiatar” e não necessariamente enquanto ele exercia o sumo sacerdócio.
15) A morte de Judas
At 1.8 diz que Judas “precipitou-se, rompendo-se pelo meio, e todas as suas entranhas se derramaram”, enquanto Mt 27.5 diz que ele “foi enforcar-se”. Os dois relatos se completam. Judas tentou se enforcar e, devido a algum imprevisto como a ruptura da corda ou do galho, ele caiu de um lugar alto, o que causou os danos citados em At 1.8.
16) Problemas em ‘At 7’
Atos 7 apresenta um discurso de Estevão ao Sinédrio que apresenta algumas dificuldades. Nesse caso, mesmo que Estevão tivesse errado, Lucas registrou corretamente suas palavras. Contudo, as dificuldades apresentadas no discurso de Estevão não precisam necessariamente estar erradas.
Em At 7.6, Estevão diz que o cativeiro durou 400 anos (assim como Gn 15.13), enquanto Ex 12.40 menciona 430 anos. Se observarmos bem, o texto de Ex 12.40 diz que o povo “habitou” no Egito por 430 anos. Estevão, por sua vez, falou que a “escravidão” durou 400 anos.
Outro problema está em At 7.14 onde Estevão diz que a família de Jacó tinha 75 pessoas, enquanto Gn 46.27 diz que eram 70. Estevão deve ter se referido ao texto da Septuaginta, o qual registra, em Ex 1.5, o número de 75 pessoas, o que inclui o filho e o neto de Manassés e dois filhos e um neto de Efraim.